A Face Humana de Deus


A face humana de Deus se manifesta em Jesus Cristo, n’Ele Deus se revela ao ser humano no seu espaço e no seu tempo. Nisto nos ajuda o apóstolo São Paulo quando remete à comunidade de Corinto dizendo: “Pois nosso conhecimento é limitado, e limitada é a nossa profecia. Mas, quando vier a perfeição, o que é limitado desaparecerá. [... ] agora vemos em espelho e de maneira confusa, mas, depois, veremos face a face”.[1]  Portanto Deus está além da compreensão do ser humano, ele transcende às necessidades temporais e espaciais do homem, contudo, tudo que o homem pense sobre Deus está além de quem é Deus. A realidade de Deus é inclusive antinômica.  

Jesus Cristo, sendo a face humana de Deus revela n’Ele as realidade divina e humana, nesta última suas virtudes e necessidades.  Essa face trás à luz do conhecimento humano a misericórdia, a mansidão, a humildade, a liberdade e a alegria e dor. Para o homem que é alvo desta revelação divina é permitido encontrar-se na humanidade de Cristo com a divindade humana, sendo ele feito a imagem e semelhança de seu criador[2].

A primeira manifestação da face humana de Deus é a misericórdia. Essa não é o amor finito humano, mas nela está contido o amor humaníssimo de Deus que transcende ao infinito, aquele que vai até e além da cruz[3].  O amor que consiste em amar mesmo quando haja indignidade naquele que é amado. O amor de Deus revelado em Jesus Cristo é este: misericórdia. Balthasar nos coloca duas maneiras de compreender didaticamente a misericórdia de Deus, a quantidade que é o amor completo (ágape) e a qualidade, que é o amor humanissímo que vai além do humano se tornando infinito.

Talvez, para a concepção filosófica ocidental o Deus cristão seja estranho, pois na sua misericórdia ele se arrepende e se faz próximo do homem. De fato, o Deus cristão é diverso do deus grego, pois a este não existe espaço para o homem mas somente para sua perfeição. Deus age com misericórdia e respeita a liberdade humana.

A segunda manifestação da face humana de Deus é a mansidão, que está intimamente ligada à misericórdia. Essa manifestação está na questão da cólera e da ira que não são suprimidas em Deus, porém, são moderadas. Em Deus existe a irá e a cólera, porém, as sua com parcimônia.

A terceira manifestação da face humana de Deus é a humildade. Esta é propriamente humana, pois o homem foi feito da terra. Jesus Cristo assume a humildade, mas não apenas na sua dimensão física, assume também na sua conduta, expressando assim superioridade da humildade que não é meramente humana, mas divina. A humildade é sair de si mesmo e ir em direção do outro sem perder o seu ser, semelhante à última ceia quando o Cristo lava os pés dos seus discípulos[4].

A quarta manifestação da face humana de Deus é a liberdade.  Essa manifestação é uma liberdade distinta da dos filósofos, não é uma liberdade opressora e sufocante, é altruísta. Visa a vida do outro e não o sujeito em questão.  Em Jesus Cristo encontramos tão liberdade, que é a libertação da liberdade humana, isso significa não tornar o homem apenas liberto da política, da economia, do tempo, etc., mas transcender sua liberdade ao sentido último.

A última face da manifestação humana de Deus é a alegria e a dor.  Esse binômio da face de Deus expressa aquilo que há de mais humano, e que Jesus Cristo viveu plenamente. Viveu a alegria da cruz que foi um momento angustiante isso mostra que a alegria de Cristo é ontológica, ou seja, essencialmente de seu ser, e não temporal e transitória, como um acidente.  Além da alegria, Jesus Cristo viveu a dor, em todas as dimensões humanas, a saber: física, moral e espiritual. Mostrando o máximo da condição humana, isso subverte o pensamento dos filósofos, pois Deus não é impassível a tal condição. Isso não significa que não exista beatitude na Trindade, mas que somos tardos a compreender, transcende nossa inteligibilidade, conseguimos apenas compreender analogicamente.

Com o estudo da face humana de Deus, nas suas diversas manifestações, concluí-se que a compreensão desse ministério faz o homem intuir mais que a razão possa explicar. Estudar a face de Deus na humanidade, mais especificamente em Jesus Cristo dá ao homem o desejo insaciável do infinito, saudade de Deus. 

Rafael Lopes Ciufa
Rogério Ramazotti Calelo
 
Bibliografia: MODIN, Battista. Quem é Deus?: Elementos de teologia filosófica. Trad. José Maria de Almeida. São Paulo: Paulus, 1997. 447 p.

[1] 1 Cor 13,9-10; 12
[2] Cf. Gn 1, 27
[3] Cf. Fl 2, 8
[4] Cf. Jo 13, 1-15